PAULO VIEIRA
SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Visitas feitas às sedes de empresas vão se firmando como importante ação de comunicação e reputação e, eventualmente, de atração de talentos. Tudo isso sem fazer cócegas ao faturamento.
As companhias, especialmente indústrias, mantêm estruturas de visitação que buscam criar –ou referendar– imagem positiva para suas marcas entre públicos diversos (ou, no jargão do setor, “stakeholders”), que podem ser comunidades vizinhas, consumidores ou estudantes de áreas de afinidade.
No Brasil, as empresas de São Bernardo do Campo, no ABC paulista, são as que mais se beneficiam de um programa minimamente organizado, com fomento municipal.
O programa de turismo industrial, criado pela prefeitura em 2013, leva munícipes e forasteiros para o interior de empresas como Wheaton, Scania, Ecovias, Omnisys, Friozem, Unipar, Grob e Braskem, entre outras.
As visitas, que obedecem a um calendário produzido com antecedência, valeram à cidade o título de “capital brasileira do turismo industrial” -não havia muita concorrência pelo título.
A gaúcha Caxias do Sul, que chegou a estruturar algo semelhante por seus polos metal-mecânico e de confecção, vive entressafra de seu programa.
Independentemente do quão justo é o título concedido a São Bernardo do Campo, a cidade paulista colecionou dividendos com a iniciativa.
Em 2019, se tornou município de interesse turístico do estado de São Paulo, passando a ter direito a uma fatia do orçamento estadual destinado a investimentos turísticos.
Produtora de vidros para as indústrias farmacêutica e de cosméticos e de copos e pratos para o consumidor final, a Wheaton participa do programa há dez anos.
Nas visitas que recebe, busca defender as propriedades do vidro, material que, segundo a empresa, é totalmente reciclado e melhor para a conservação de aromas do que os compostos plásticos.
“Reforçamos a impressão geral de que produtos como perfumes e bebidas se conservam melhor em embalagens de vidro”, diz Dener Goudinho, gerente de RH e Logística da Wheaton.
Durante as visitas à fábrica, Goudinho destaca o que considera ser um importante momento visual do percurso: o processo de queima que gera a gota inicial de vidro. A visão do “nascimento” do material teria, portanto, a capacidade de impactar o visitante, levando-o a optar pelo vidro.
Fabricante de soda cáustica, cloro e PVC, a Unipar mantém o programa “Fábrica Aberta” há quase quatro décadas em sua unidade de Cubatão, na Baixada Santista -e mais recentemente também nas unidades de Santo André e Bahía Blanca, na Argentina.
Para Rodrigo Cannaval, que em abril se torna o CEO da Unipar, o grande objetivo é informar e dar visibilidade de seus processos produtivos para stakeholders diversos, como a comunidade de moradores que pode vir a ser prejudicada por eventuais acidentes ambientais.
“Comparo o programa ao ‘visite nossa cozinha’ dos restaurantes”, disse Cannaval em entrevista por teleconferência à Folha.
“No caso de Cubatão, cidade que já foi considerada a mais poluída do mundo, é importante não alimentar uma torcida contrária. Queremos melhorar nossa licença social de funcionamento, transformar a tolerância que os vizinhos têm com nossas fábricas em algo ainda mais positivo, de convivência.”
O programa, que foi retomado em 2023 após os anos de pandemia, já levou 124 mil pessoas às unidades da Unipar desde sua implementação, em 1985. A empresa não revela quanto investe para mantê-lo, mas disse que esse valor sai do Departamento de Comunicação e Sustentabilidade.
Essas visitas, afinal, são uma questão de imagem e reputação.
ÊXODO
Berço histórico das montadoras brasileiras, o ABC viveu o esvaziamento do segmento automobilístico, que migrou em busca de mão de obra mais barata e, sobretudo, de benefícios fiscais e imobiliários.
Entre as empresas que sobraram está a Scania, que participa do programa de turismo industrial de São Bernardo e também é responsável por um de seus pontos altos, segundo seus organizadores: os visitantes fazem um test-drive em caminhão que acaba de ser montado e finalizado.
A Toyota, que deixou recentemente o ABC, preservou o programa de visitas em sua unidade fabril de Sorocaba. Otacílio do Nascimento, gerente de Comunicação Corporativa da operação brasileira, disse que o programa visa difundir “valores, compromissos, operações e história” da marca japonesa e estabelecer uma “conexão mais profunda e genuína” da Toyota com seus stakeholders.
“O programa responde por um apelo técnico, com foco em iniciativas ambientais, além de ser uma forma de aproximar a marca da comunidade”, afirmou. “Ao segmentar grupos como acadêmicos, colaboradores, clientes e a comunidade em geral, a Toyota personaliza as mensagens transmitidas durante as visitas.”
O executivo citou ainda que a empresa investiu R$ 800 mil em um centro de visitas de 400 m² na planta de Sorocaba.
Para Mitsuru Yanaze, coordenador do curso de pós-graduação de gestão de comunicação e marketing da ECA-USP e autor de livros sobre a disciplina, “promover visitas às suas instalações propicia às empresas uma aproximação e experiência com seus públicos tão raras quanto fundamentais para a valorização das marcas”.
E prossegue: “Como o contato é pessoal, a empresa pode realizar pesquisas e registrar informações que irão facilitar a apuração dos resultados dos investimentos realizados nessa atividade”.
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