MANAUS, AM (FOLHAPRESS) – A Venezuela afirmou ter destruído uma pista de pouso clandestina usada como base por aviões que atuavam no garimpo ilegal na Terra Indígena Yanomami. Além da divulgação da informação em canais da Força Aérea do país, o governo venezuelano comunicou o Ibama (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis) sobre a destruição da pista.
O Ibama havia informado à embaixada da Venezuela no Brasil sobre a existência de duas pistas clandestinas na região de fronteira entre os dois países, com operação no país vizinho, a poucos quilômetros da terra yanomami, em Roraima.
Segundo as informações repassadas pela embaixada ao órgão ambiental, a pista destruída é a flagrada pela reportagem da Folha no último dia 10. As imagens divulgadas pelos militares venezuelanos têm semelhanças com a pista.
O jornal acompanhou uma visita de comitiva de ministros do governo Lula (PT) à região de Auaris, a mais distante do território, na fronteira com a Venezuela. No voo, foi possível flagrar a pista clandestina, com nove aviões estacionados. Segundo as coordenadas geográficas disponíveis, a estrutura logística estava localizada no território venezuelano, 5 km adentro.
O governo brasileiro chegou a planejar a destruição da pista e das aeronaves, mas o plano ficou pelo caminho diante da constatação de que a estrutura estava do lado venezuelano.
Agentes do Ibama já sabiam que as aeronaves eram operadas por brasileiros e atuavam na terra yanomami. A presença de um entreposto no lado venezuelano foi a forma encontrada para driblar a fiscalização.
Em dezembro, o Ibama destruiu duas aeronaves oriundas da pista clandestina na Venezuela, informação confirmada a partir de verificação do material de voo. Os aviões atuavam no garimpo na terra yanomami, em áreas de retomada de exploração ilegal de ouro e cassiterita, conforme o órgão. Em 2022, um avião do mesmo suposto dono dessa logística foi destruído pelo órgão ambiental.
O homem apontado pelo Ibama como responsável por essa logística do garimpo é José Olímpio Lima Silva Sobrinho, de Ji-Paraná (RO). Ele foi multado em mais de R$ 3 milhões no último dia 22.
À Folha de S.Paulo, por mensagem de telefone, Sobrinho disse que desconhece o assunto. “Meu representante está vendo isso”, afirmou ele, que não quis comentar as informações sobre a pista e as aeronaves clandestinas.
Os aviões que usavam a pista na Venezuela operavam em garimpos nas regiões de Homoxi e Xitei, entre outras, conforme informações levantadas pelo Ibama. É nessas regiões que a exploração ilegal de ouro retomou força, com consequência direta à saúde dos indígenas -a desnutrição se incorporou à rotina de crianças, e surtos de malária são corriqueiros.
Diante da persistência da crise humanitária dos yanomamis e dos repiques do garimpo ilegal, o governo federal anunciou a presença de uma “casa de governo” em Roraima para tratar das ações no território e a instalação de três bases de vigilância, com forças de segurança como PF (Polícia Federal) e Forças Armadas. Os gastos previstos são de R$ 1,2 bilhão.
Nos últimos meses, os militares brasileiros abandonaram ações na terra yanomami. O Exército não faz operações a contento, apesar da presença de dois PEFs (pelotões especiais de fronteira) exatamente nas regiões mais críticas, Auaris e Surucucu; a Aeronáutica falha no controle do espaço aéreo; e a Marinha errou estratégia usada em operação passada, segundo agentes de fiscalização.
Nesta segunda (29), o MPF (Ministério Público Federal) em Roraima informou que a Justiça Federal estabeleceu multa de R$ 1 milhão caso o governo não apresente, em 30 dias, um novo cronograma de ações para enfrentamento ao garimpo na terra yanomami. A decisão atende a pedido do MPF.
“A medida foi necessária diante da inércia do Estado brasileiro em elaborar um planejamento efetivo para a instalação de bases de proteção e retirada dos invasores do território tradicional”, afirmou a Procuradoria em Roraima.
Uma audiência de conciliação foi feita com integrantes do governo federal, e a União se comprometeu com um novo cronograma de ações de desintrusão, com uma base de vigilância e com a implementação de políticas públicas permanentes no território, conforme o MPF.