(FOLHAPRESS) – No velório de Mike Emme, em setembro de 1994, nos Estados Unidos, familiares e amigos distribuíram fitas amarelas com frases de apoio para pessoas que pudessem estar em sofrimento emocional. O jovem de 17 anos, dono de um Mustang 68 amarelo, morreu por suicídio.
Uma das frases nas fitas era “Se precisar, peça ajuda”.
O mote é o mesmo usado pela ABP (Associação Brasileira de Psiquiatria) na campanha do Setembro Amarelo deste ano. O objetivo, segundo a associação, é estimular pessoas com pensamentos de morte a entenderem que podem estar doentes e que merecem receber tratamento.
Estudos feitos pela OMS (Organização Mundial da Saúde) apontam que 90% das mortes por suicídio estão ligadas a transtornos mentais, como depressão, bipolaridade, esquizofrenia, alcoolismo e ansiedade.
“Suicidaram-se porque não tinham acesso ao tratamento ou o tratamento era ruim. Ou seja, quem se suicida é porque tem alguma doença e por isso precisa pedir ajuda”, afirma o presidente da ABP, Antônio Geraldo da Silva, coordenador da campanha.
A psiquiatra Ana Paula Werberich Lange, diretora técnica do Hospital Francisca Júlia CVV (Centro de Valorização da Vida), diz que o primeiro passo para pedir ajuda é aceitar que está tudo bem sentir as próprias emoções.
“A pessoa precisa reconhecer que não é culpa dela, não é fraqueza, não é que ela não consegue dar conta de si mesmo. Quando o sintoma invade a pessoa, ela não consegue mais fazer as próprias escolhas (por exemplo: estou triste, mas não queria estar), e precisa de ajuda”, afirma a médica.
Lange diz que antes de pensar no suicídio em si, a pessoa geralmente começa a ter pensamentos como “Era melhor se eu não tivesse mais aqui”, “Queria enfiar a cabeça no buraco e nunca mais tirar” ou “Queria desaparecer”.
Ela compara o caminho até o ato de tirar a própria vida com a escalada de uma montanha. “O ato suicida é quando a pessoa chegou ao topo dessa montanha”, diz. A caminhada começa com a angústia ou mal-estar existencial, evolui para a visualização da morte como uma saída e, então, pode se estruturar com o planejamento da forma de morrer e de providências pós-morte. Durante todo esse tempo, o ato pode ser interrompido.
“Se o indivíduo conseguir reconhecer e buscar ajuda nesse momento, a gente está falando de prevenção”, afirma a psiquiatra.
O auxílio que deve ser procurado, segundo os especialistas, é, antes de tudo, profissional. O psiquiatra Daniel Kawakami, do Instituto de Psiquiatria da USP (Universidade de São Paulo), diz que aqueles com ideação suicida devem buscar um pronto-socorro com psiquiatras.
“Mesmo que não tenha esperança e não veja solução nenhuma, é o trabalho do psiquiatra e do serviço de saúde mental ajudar”, diz Kawakami.
Caso não exista um pronto-socorro com a especialidade por perto, a orientação para pessoas que têm pensamentos de morte é procurar qualquer serviço de saúde, inclusive o Samu (Serviço de Atendimento Móvel de Urgência), e relatar todos os seus sintomas.
O suicídio, segundo o presidente da ABP, é uma emergência psiquiátrica. “Se tiver um acidente e quebrar o braço, chamo o Samu. Se tenho dor no peito com irradiação para o braço, chamo o Samu. O mesmo deve ser feito se tiver manifestações psiquiátricas”, afirma Silva. UBSs (Unidades Básicas de Saúde) e UPAs (Unidades de Pronto Atendimento) também são opção.
Silva define os sintomas psiquiátricos como alterações comportamentais que causam diminuição na qualidade de vida. “Hoje você trabalha normalmente, aí começa a não chegar mais no horário. Tem dificuldade para dormir e acordar. Começa a ter perdas nos relacionamentos interpessoais”.
COMO RECONHECER TRANSTORNOS MENTAIS
Psiquiatras Ana Paula Werberich Lange, Antônio Geraldo da Silva e Daniel Kawakami listam comportamentos que podem indicar ideação suicida. Eles podem ser reconhecidos pela própria pessoa ou por uma rede de apoio.
1 – Isolamento progressivo do convívio social
2 – Humor deprimido
3 – Melhora brusca após período de humor deprimido
4 – Insônia ou muito sono
5 – Desesperança e falta de planos para o futuro
6 – Falta de prazer nas atividades anteriores
7 – Mudança na alimentação (passar a comer muito ou não comer)
8 – Mudança de comportamentos que provocam perda na qualidade de vidaIsolamento, sumiço das redes sociais, mudanças repentinas de humor, ansiedade, irritabilidade, alterações no padrão alimentar, insônia ou muito sono podem ser sinais de ideação suicida. É neste momento que amigos, parceiros, familiares e colegas podem ajudar. A rede de apoio pode alertar a pessoa sobre uma mudança de comportamento ao identificá-la.
Os psiquiatras indicam que alguém com proximidade se ofereça para ouvir como a pessoa está, mas não ofereça conselhos e busque ajuda profissional. Ligar para os canais do CVV pode ajudar quem não tem rede de apoio ou não quer buscar ajuda profissional.
De acordo com a OMS, uma média de 39 pessoas se suicidam por dia no Brasil. Esta é a quarta maior causa de morte entre pessoas de 15 a 29 anos.
A campanha Setembro Amarelo, inspirada na história de Mike Emme e sua família, tem como intenção alertar que esse é um problema de saúde pública e incentivar sua prevenção. O dia 10 de setembro é lembrado como o Dia Mundial da Prevenção ao Suicídio.
“Se precisar, peça ajuda. Não deixa ficar grave, não deixa ficar impossível de ser ajudado”, diz Silva, presidente da associação de psiquiatria.
*ONDE BUSCAR AJUDA
A recomendação dos psiquiatras é que a pessoa busque qualquer serviço médico disponívelNPV (Núcleo de Prevenção à Violência)
Os NPVs são constituídos por ao menos quatro profissionais dentro das UBSs (Unidades Básicas de Saúde) e de outros equipamentos da rede municipal. Para acolher e resguardar as vítimas, os núcleos atuam em parceria com o Ministério Público, a Defensoria Pública, o Conselho Tutelar, a Secretaria Municipal de Educação e a Secretaria Municipal de Assistência e Desenvolvimento Social.Pronto-Socorro Psiquiátrico
Ideação suicida é emergência médica. Caso pense em tirar a própria vida, procure um hospital psiquiátrico e verifique se ele tem pronto-socorro. Na cidade de São Paulo, há opções como o Pronto Socorro Municipal Prof. João Catarin Mezomo, o Caism (Centro de Atenção Integrada à Saúde Mental) e o Hospital Municipal Dr. Arthur Ribeiro de Saboya.Mapa da Saúde Mental
O site, do Instituto Vita Alere, mapeia serviços públicos de saúde mental disponíveis em todo território nacional, além de serviços de acolhimento e atendimento gratuitos, além de ações voluntárias realizadas por ONGs e instituições filantrópicas, entre outros. Também oferece cartilhas com orientações em saúde mental.CVV (Centro de Valorização da Vida)
Voluntários atendem ligações gratuitas 24 h por dia no número 188, por chat, via email ou diretamente em um posto de atendimento físico.
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