SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – A 123milhas, plataforma de turismo que entrou em crise no último dia 18, com a suspensão de pacotes e viagens promocionais, bateu o recorde de reclamações no site Reclame Aqui. Até o último domingo (27), foram 42.246 queixas -mais do que a empresa observou em todo o ano de 2021 (36.085).
Nesta segunda-feira (28), a 123milhas anunciou uma reestruturação, com corte de pessoal -o montante não foi informado, mas a Folha apurou que são pelo menos cem pessoas, das áreas administrativa, financeira e tecnologia. A empresa também anunciou a suspensão do site HotMilhas, de venda e compra de milhas aéreas.
O pico de queixas contra a 123milhas ocorreu em 19 de agosto, um dia depois do anúncio de suspensão das vendas, quando a empresa registrou 3.415 reclamações no site. Até então, a 123milhas estava muito bem avaliada junto ao Reclame Aqui, com alto índice de respostas e resolução de problemas. Agora, a reputação da empresa aparece “sob análise” no site.
Já no ano passado, a 123milhas viu o montante de clientes descontentes com o serviço mais do que dobrar, de 36.085 para 75.867. Entre as queixas mais comuns ao longo do ano passado e deste ano estão “estorno do valor pago” e “propaganda enganosa”.
Uma das queixas protocolada no Reclame Aqui por uma consumidora de Cascavel (PR) registrada no início de março, antes do início da crise, diz respeito a um pedido de reembolso de passagem.
A consumidora disse que a companhia aérea confirmou ter feito o depósito, mas que o estorno foi feito para outro banco, conta e CPF.
“A conta e o valor informados no email da companhia aérea estão completamente errados”, disse a consumidora na reclamação ao Reclame Aqui. “Tenho o nome da pessoa para quem foi transferido o valor, é Antônia Cristina Soares Madureira, de Belo Horizonte. Solicito que a mesma me devolva o valor depositado pela companhia aérea”, diz a cliente, na reclamação.
Antônia Cristina Soares Madureira é da família dos controladores, os irmãos mineiros Augusto Júlio e Ramiro Júlio Soares Madureira. Tanto a 123milhas quanto a HotMilhas têm sede em Belo Horizonte.
A 123milhas respondeu à queixa sete dias depois, informando à consumidora que a equipe financeira foi acionada e “habilmente ajudou nesta demanda”. “O reembolso foi realizado e conforme nosso contato, ficamos felizes com a conclusão da sua solicitação, mediante a identificação do valor em conta”, informou.
Clientes não recebem pagamento por milhas vendidas à HotMilhas
O site Reclame Aqui também observou um pico de reclamações contra a HotMilhas, a primeira empresa dos irmãos Soares Madureira no negócio de turismo, fundada antes da 123milhas.
De acordo com o site, no acumulado de 1º de janeiro a 27 de agosto deste ano, foram 2.038 queixas contra a HotMilhas, que já superam as 1.878 registradas no ano passado. As reclamações mais comuns são “não recebimento do pagamento” e “problemas na utilização de pontos e milhas”.
Houve um pico de 37,6 mil acessos à página da HotMilhas no Reclame Aqui no domingo (27), o maior volume de visitas de consumidores em busca de informações na página da empresa desde janeiro de 2022.
Já o pico de visitas na página da 123milhas no Reclame Aqui ocorreu no último dia 19: 120 mil acessos, também uma busca recorde desde janeiro de 2022.
Empresa diz que pacotes e passagens flexíveis representavam 15% das operações
“Acho que todas as empresas que apostaram no preço baixo das viagens, por conta da crise no setor de turismo na pandemia, estão perdendo o jogo”, diz Edu Neves, presidente do site Reclame Aqui. “A aposta de que eu iria vender muito barato pacotes e viagens agora e comprar barato lá na frente não se confirmou”, diz ele, referindo-se aos pacotes e às passagens flexíveis, sem data definida que, segundo analistas, estão na origem na crise não só da 123milhas, como do Hurb.
Segundo Neves, o prenúncio da crise atual ocorreu no segundo semestre do ano passado, quando estouraram as reclamações contra a 123milhas no site. “Agora a crise explodiu, diante da incapacidade da empresa em cumprir seus compromissos com consumidores.”
O executivo afirma que o cliente deve seguir com o registro dos problemas no site Reclame Aqui, anexando comprovantes das transações com 123milhas e HotMilhas. “Se puder, procure os meios legais”, diz Neves. “Dificilmente a empresa vai cumprir compromissos de maneira espontânea. Essa crise deve caminhar para uma solução via ação civil pública, possivelmente com a assinatura de um TAC [Termo de Ajustamento de Conduta]”, afirma.
Em coletiva de imprensa nesta segunda, o promotor César Martins, do MP-SP (Ministério Público de São Paulo), disse que não há necessidade de ajuizar ação individual, uma vez que existe uma ação civil pública proposta em São Paulo. “Houve hoje uma audiência preliminar nesta segunda, com o corpo jurídico da empresa”, afirmou Martins.
Segundo ele, a 123milhas alegou que as passagens e os pacotes flexíveis representavam 15% da operação. A empresa afirmou que houve aumento significativo dos preços das passagens aéreas, com uma “grande discrepância” entre o que foi reservado para a compra dos bilhetes e quanto foi cobrado dos clientes. Diante disso, a companhia criou um sistema de vouchers aos consumidores, na tentativa de equacionar a demanda.
No entanto, conforme reportagem da Folha de S.Paulo, uma passagem cancelada pela 123milhas pode custar o dobro do valor pago inicialmente com voucher oferecido pela empresa. Além disso, o valor pago pelo cliente foi dividido entre três e cinco vouchers e não é possível resgatá-los de uma só vez.
De acordo com Martins, a promotoria requisitou informações da empresa e deve marcar uma audiência inicial. “O objetivo é fazer um TAC”, disse. Até lá, segundo o promotor, o cliente deve seguir fazendo registro das queixas no site consumidor.gov, junto aos Procons estaduais e ao Reclame Aqui.