Nova câmera corporal da PM de SP permite excluir vídeo e favoreceu empresa, dizem concorrentes

SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Seis empresas apresentaram recursos pedindo a anulação do processo de escolha da fornecedora das novas câmeras corporais da Polícia Militar de São Paulo, afirmando que houve descumprimento de regras e até indícios de fraude no processo.

 

O pregão eletrônico para a compra das novas câmeras teve a Motorola como vencedora, e a companhia passou por uma avaliação dos equipamentos no fim de junho.

As companhias afirmam que as câmeras corporais selecionadas pela PM não têm a autonomia de bateria suficiente, não são capazes de ler placas de automóveis conforme as exigências do edital, e que o sistema de gerenciamento dos arquivos permite a alguns usuários apagar imagens –o que também é vetado pelas regras do edital, além de ser um risco para investigações que dependem das imagens.

Os recursos apresentados pelas empresas foram noticiado inicialmente pelo site G1, e confirmados pela reportagem. Questionada, a SSP (Secretaria de Segurança Pública) da gestão Tarcísio de Freitas (Republicanos) afirmou que “todas as amostras de testes para a prestação de serviços para a prova de conceito cumpriram os requisitos legais, técnicos e tecnológicos exigidos” e que “as denúncias são infundadas”.

As empresas apresentaram os questionamentos após acompanharem a prova de conceito, etapa que avalia se os equipamentos cumprem os critérios exigidos em edital. Os recursos foram apresentados pelas empresas Interimagem, IPQ, Tronnix, Teletex, Teltex e BB Comércio e Instalação de Equipamentos Eletrônicos.

Mais de uma empresa apontou os mesmos problemas na prova, e algumas sugeriram inclusive que pode ter havido manipulação dos testes. Ao menos quatro delas apontaram que o gerenciamento de arquivos da Motorola tinha um botão “excluir” disponível a usuários logados como administradores no sistema. Elas apresentaram fotos da tela mostrando o botão.

A PM, no entanto, diz no termo de referência da licitação que “é vedada a exclusão manual de arquivos”.

Vários concorrentes também apontaram problemas nos testes de bateria dos equipamentos. O edital exige que as baterias durem ao menos 12 horas de uso e 4 horas durante transmissões de vídeo (o modo live streaming). As empresa dizem que a Motorola não comprovou o cumprimento de nenhum dos requisitos.

No caso do teste de 12 horas, as empresas afirmam que o sistema de GPS das câmeras ficou desligado para economizar bateria. Elas apresentaram imagens das telas com a localização dos equipamentos que dois estavam faltando.

“Misteriosamente, as duas bodycams de teste de bateria, C07 e C08, que deveriam estar demonstrando o GPS ativo como os demais, estão com o sistema de georreferenciamento ora hibernando, ora simplesmente desligado”, relatou a Interimagem. “Essas ações foram claramente tomadas para economizar bateria e, assim, conseguir concluir a prova de conceito com carga.”

Sobre o teste de bateria durante a transmissão de vídeo, a empresa Teletex afirmou que “o live streaming dessas COPs foi aberto no sistema da Motorola e apresentado ao público. Em seguida, ele foi fechado e reaberto apenas ao final das 4 horas. Ou seja, se o livestream não ficou aberto durante todo o período do teste, é impossível validar este item”. Outras empresas relataram o mesmo.

Ao menos três empresas também relataram que a prova de conceito não demonstrou a leitura automática de placas de automóveis, especialmente placas com o padrão Mercosul. “Em nenhum momento o sistema capturou quaisquer placas”, afirmou a BB Comércio e Instalação de Equipamentos. “A única captura ocorreu quando um dos agentes se aproximou de um veículo com placa antiga, e então o sistema capturou essa placa de maneira muito rápida e não houve qualquer checagem para analisar se a captura realizada estava correta.”

Um dos recursos aponta que a própria Motorola admitiu que descumpriria outra exigência do edital, que é a identificação automática de armas de fogo. Essa informação está em um email enviado pela empresa à PM em dezembro de 2023, no qual informa que “a solução não consegue reconhecer armas de fogo, mochilas entre outros objetos que não sejam pessoas e veículos”.

Concorrentes também questionaram a atuação de uma empresa, a Emiter, na prova de conceito.

A Tronnix relata que todos os testes foram conduzido pela empresa, e argumenta que, pelas regras de licitação do país, isso deveria ter sido feito por representantes do poder público.

Além da anulação do processo, algumas empresas também pedem o afastamento da Emiter da avaliação.

A reportagem entrou em contato por email com a Motorola Solutions, responsável pelo desenvolvimento das câmeras, mas não recebeu resposta até a publicação deste texto.

Questionamentos a licitações por concorrentes derrotados são comuns no Brasil. Os recursos apresentados pelas empresas se somam a outros questionamentos feitos à licitação por entidades da sociedade civil.

O edital lançado pela gestão Tarcísio faz alterações significativas em relação ao sistema atualmente em vigor, principalmente na forma como a gravação é feita. Hoje a corporação conta com pouco mais de 10 mil câmeras que gravam de forma ininterrupta, sem que o policial precise acioná-las. Ele pode apenas apertar um botão que melhora a qualidade da imagem e do áudio.

Com o novo edital, caberá ao policial ligar a câmera para que a gravação tenha início. Além disso, uma central também poderá fazer o acionamento caso ela perceba que o agente na rua descumpriu o protocolo e não ligou o equipamento.

Especialistas em segurança pública já apontaram que o novo modelo pode trazer prejuízos para futuras investigações, ao deixar sob responsabilidade dos policiais na rua a ligação do equipamento.

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