Juíza condena União a pagar R$ 1 mi a professor preso e torturado na ditadura

A juíza federal Fernanda Ribeiro Pinto, da 4ª Vara Federal de Niterói, condenou a União a indenizar – por danos morais – em R$ 150 mil, ou cerca de R$ 1 milhão atualizados, o professor João Florêncio Junior, vítima de prisão ilegal e torturas no regime militar (1964-1985). Hoje com 73 anos, João Florêncio foi preso em 1972. À época, tinha 21.

A magistrada julgou parcialmente procedente o pedido. Ela pontuou que nos autos do processo a União ‘sequer contestou de forma especificada tais alegações, as quais foram suficientemente corroboradas pelas provas’.

A União sustentou, porém, que a pretensão do autor da ação estaria prescrita. Mas a juíza observou que o Superior Tribunal de Justiça já pacificou entendimento de que, em casos em que houve ‘patente violação de direitos humanos, em um cenário de regime de exceção, a pretensão é imprescritível’.

Sobre o valor da indenização deverão incidir correção monetária, conforme estabelecido pela Súmula 362 do Superior Tribunal de Justiça, e juros de mora a partir da data da prisão, ocorrida em 25 de abril de 1972, conforme determinado pela Súmula 54 do STJ – atualizado, o valor da indenização ultrapassa R$ 1 milhão.

Para o advogado do professor, João Pedro Brígido, a sentença reflete ‘ainda que minimamente, a gravidade dos atos cometidos contra o autor e a necessidade de reparação histórica e moral’.

A prisão de João Florêncio ocorreu no dia 25 de abril de 1972. Segundo a ação, o professor foi levado às dependências do DOI-Codi e torturado pelas Turmas de Interrogatório Preliminar. Só foi libertado em 11 de dezembro de 1972, quase 8 meses depois.

O DOI-Codi (Destacamento de Operações e Informações do Centro de Operações e Defesa Interna) era o braço mais pesado da repressão. Ele funcionava junto aos comandos militares.

Ao condenar a União, a juíza federal observou que ‘há provas de que, durante o tempo em que permaneceu em cárcere, (João Florêncio) foi submetido à tortura’.

A decisão diz que, em 1972, o professor foi preso, em Pernambuco, por um ‘órgão de segurança’, enquanto cursava bacharelado de Física, por causa de seu suposto envolvimento com o Partido Comunista Brasileiro Revolucionário (PCBR) e de prática de ‘atividades subversivas’.

“Fica claro que a prisão foi motivada por razões políticas”, escreveu a juíza Fernanda Ribeiro Pinto, para quem ‘o regime militar agiu estratégica e coordenadamente e, um por um, jogou os presos para o DOI-Codi, que realizava os interrogatórios iniciais e lá submetiam os militantes a choques elétricos, pau de arara e sessões de espancamento’.

Ela ressalta que ‘a tortura foi o instrumento que permitiu ao Doi Codi extrair as informações dos presos e, a partir delas, chegar a novos integrantes do PCBR’ – como narrado, tempos depois, junto à Comissão da Verdade, pelo deputado e professor de economia da Universidade Federal de Pernambuco, Pedro Eugênio, que foi vizinho de cela de João Florêncio.

Para o advogado João Pedro Brígido, que representou o professor na ação, a decisão judicial ‘não apenas reconhece os danos sofridos pelo professor, mas também reafirma o compromisso do Poder Judiciário com a verdade, a justiça e a memória histórica, contribuindo para que episódios sombrios como os ocorridos durante a ditadura militar não sejam esquecidos e para que as violações aos direitos humanos nunca mais se repitam em nosso país’.

“A sentença revela um compromisso das instituições brasileiras em reparar, ainda que minimamente, os danos causados pela injustificável violência do Estado contra aqueles que pensavam diferente do regime ditatorial”, avalia Brígido.

Para o advogado, ‘ao condenar a tortura e o aprisionamento ilegal, o Poder Judiciário não consegue, nem pretende, apagar esses terríveis fatos da história’.

“Também não é capaz de fazer sumir os irreversíveis abalos psíquico e físico provocados à vítima. No entanto, sentenças como esta garantem que a arbitrariedade do Estado não passará impune pelo Poder Judiciário nem será esquecida pela sociedade”, argumenta João Pedro Brígido.

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