Importação de criptoativos no Brasil dobra no primeiro bimestre do ano

(FOLHAPRESS) – A importação de criptoativos –ativos virtuais que incluem criptomoedas como o bitcoin, que voltou a disparar em 2024– segue em forte alta no Brasil e mais do que dobrou no primeiro bimestre em relação ao mesmo período do ano passado.

Segundo dados do Banco Central divulgados na quinta-feira (4), houve um salto de US$ 1,396 bilhão no acumulado de janeiro e fevereiro de 2023 para US$ 2,938 bilhões na soma dos dois primeiros meses deste ano –crescimento de 110,31% nesse intervalo.

A importação dos criptoativos reflete o fluxo desses ativos digitais entre um não residente (vendedor) para um residente (comprador) no Brasil, e as transações comerciais são medidas pela autoridade monetária por meio de contratos de câmbio.

Conforme metodologia do BC, essa classificação do balanço de pagamentos não engloba stablecoins –ativos digitais com paridade em outro ativo, commodity ou moeda, por exemplo, para os quais há um emissor– e moedas digitais emitidas por bancos centrais.

Em 2023, os brasileiros importaram o recorde de US$ 12,3 bilhões em ativos virtuais, ultrapassando com folga a marca de US$ 7,5 bilhões do ano anterior fechado. Ou seja, houve um avanço anual de 64,2%.

Enquanto os valores de importação registrados no fluxo de criptoativos no balanço de pagamentos são significativos, os de exportações são baixos (US$ 146 milhões no primeiro bimestre do ano).

A relativa ausência de exportação deve-se ao alto custo de eletricidade no país, o que inibe a mineração de criptomoedas. Dados do FMI (Fundo Monetário Nacional) indicam que 80% da mineração mundial de bitcoin tem sido realizada em apenas quatro países –China, Geórgia, Suécia e EUA.

Segundo o chefe do departamento de Estatísticas do BC, Fernando Rocha, um estudo com base nas informações que estão no campo livre do contrato de câmbio verificou haver uma predominância de bitcoins nas operações, embora não haja uma definição precisa do tipo de moeda encontrada.

“Como bitcoin não tem peg [mecanismo de atrelamento] com nenhum outro ativo, as razões [de crescimento] podem ser ou especulativas ou para investimentos. Quando a gente olha preços do bitcoin, está tendo uma recuperação recente, isso pode ser uma razão para esses investimentos”, diz.

No mês passado, o bitcoin ultrapassou a marca de US$ 70 mil (cerca de R$ 350 mil) pela primeira vez, atingindo suas máximas históricas. A alta é puxada, entre outros fatores, pela demanda dos investidores por novos produtos de criptoativos negociados em Bolsa nos EUA.

Fabrício Tota, diretor de Novos Negócios do MB (Mercado Bitcoin), ressalta que, além do aumento do preço do bitcoin, houve aumento do volume negociado em reais e o mercado ficou mais aquecido no Brasil. “Esse mercado fica muito atrativo porque existe espaço para arbitragem e normalmente existe um prêmio”, diz.

“O preço do bitcoin em reais é um pouquinho mais caro do que em dólares, mesmo convertendo pelo dólar comercial. Porque precisa fazer uma operação de câmbio, vai pagar IOF, spread do câmbio. É um mercado que existe continuamente esse fluxo acontecendo”, acrescenta.

Segundo um estudo feito por funcionários do BC abordando o tratamento dos criptoativos nas estatísticas de balanço de pagamentos do Brasil, a estrutura desse mercado compreende a importação por grandes corretoras para distribuição (venda) a clientes, incluindo pessoas físicas, além do comércio doméstico.

Realizada por Fernando Lemos, Gustavo Sousa, e Thiago Vieira, a análise mostrou que o comércio internacional no segmento cripto é bastante concentrado no país, com predomínio das grandes corretoras nas transações de alto valor e participação reduzida de pessoas físicas.

De 2020 a 2022, a participação de transações internacionais realizadas por pessoas físicas no valor do comércio dos criptoativos foi de apenas 0,3%, enquanto a participação das empresas financeiras e não financeiras residentes -ou seja, das exchanges brasileiras– representou 99,7% do total.

Em dezembro de 2022, foi sancionado pelo então presidente Jair Bolsonaro (PL) o projeto de lei que regulamenta as operações financeiras realizadas com criptomoedas em território nacional.

O BC foi designado, em meados do ano passado, como órgão competente para dar seguimento a esse processo regulatório. A autoridade monetária vem trabalhando sobre as informações colhidas em uma consulta pública lançada no fim de 2023.

O avanço na regulamentação de criptoativos consta na lista de prioridades da área de regulação do BC para 2024, conforme afirmou o diretor Otavio Damaso no mês passado.

A atuação da autoridade monetária vem em linha com a pretensão do governo Luiz Inácio Lula da Silva (PT) de fechar brechas usadas por detentores de criptoativos no Brasil para driblar o pagamento de Imposto de Renda.

Como mostrou a Folha, a Receita Federal editou uma instrução normativa para aplicar aos ativos virtuais a mesma regra do IR sobre ganho de capital, válida na venda de bens como imóvel ou carro.

O governo identificou que os detentores de criptoativos estão se valendo da regra que isenta de imposto a venda de bens de pequeno valor (até R$ 35 mil) para driblar o Fisco.

A proposta para corrigir o problema é prever a aplicação da mesma regra das aplicações financeiras (alíquota de até 22,5%) sempre que esse ativo virtual for uma representação de uma aplicação financeira.

Para este ano, o Fisco anunciou na sexta (5) que vai dialogar com exchanges (corretoras de criptomoedas) estrangeiras que operam no mercado internacional para enfrentar questões de conformidade tributária.

Em fevereiro, a Receita afirmou que identificou 25.126 pessoas físicas que possuem bitcoins e não declararam o ativo virtual na Declaração de Imposto de Renda de 2023. O Fisco diz que, ao término de 2022, esses contribuintes tinham, pelo menos 0,05 bitcoin –o equivalente a cerca de R$ 10 mil em valores atuais. Ao todo, eles teriam investimentos de aproximadamente R$ 1,06 bilhão não informados à Receita.

O órgão promete se adequar neste ano para cumprir o compromisso internacional de troca automática de informações de criptoativos. O plano é iniciar as trocas em 2027, com base em dados de 2026.

“Em função desse pioneirismo do Brasil em captar informações de criptoativos, a Receita tem trabalhado com outras administrações tributárias em intercâmbios pontuais de clientes, contribuintes dessas administrações tributárias que operam pelas exchanges nacionais”, diz a subsecretária de Fiscalização da Receita, Andrea Costa Chaves.

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