Governo e Congresso discutem taxar compras internacionais até US$ 50 para compensar desoneração

IDIANA TOMAZELLI
BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) – Membros do governo Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e do Congresso Nacional discutem a possibilidade de taxar compras internacionais de até US$ 50, hoje isentas, para compensar eventual prorrogação da desoneração da folha de pagamento de 17 setores.

O Ministério da Fazenda já vinha debatendo internamente a elevação do Imposto de Importação, atualmente zerado, sobre essas mercadorias de menor valor. Hoje, os consumidores pagam apenas uma alíquota de 17% de ICMS (Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços).

Nos últimos dias, o tema foi retomado em discussões entre parlamentares em meio à tentativa de acordo entre governo e Congresso sobre o destino da política de desoneração da folha.
Nos últimos dias de 2023, em pleno recesso legislativo, a Fazenda propôs uma reoneração gradual das atividades, mas a medida enfrenta resistências de entidades empresariais e de congressistas. Os parlamentares já haviam aprovado a extensão do benefício até 2027.

Eventual manutenção da desoneração como é hoje representaria uma renúncia adicional de receitas, que precisaria ser compensada por nova fonte de arrecadação para manter o objetivo do ministro Fernando Haddad (Fazenda) de zerar o déficit em 2024.

Simulações da Receita Federal elaboradas à época do envio do Orçamento deste ano mostram que a taxação das mercadorias poderiam elevar a arrecadação entre R$ 1,23 bilhão e R$ 2,86 bilhões, considerando uma alíquota de 28% e uma queda das importações de 30% a 70% por causa do efeito do imposto.

O governo trata a discussão da cobrança sobre as remessas no contexto das negociações sobre a desoneração como uma sugestão do Congresso, mas não faz oposição à medida nem descarta sua adoção.

No Legislativo, interlocutores afirmam que a adoção da cobrança seria positiva para proteger os varejistas brasileiros da competição externa e elevar a arrecadação federal, mas evitam assumir a iniciativa da discussão.

A cautela é explicada pela alta sensibilidade do tema. No ano passado, a Fazenda chegou a instituir a cobrança da alíquota sobre as compras internacionais de até US$ 50, mas a péssima repercussão da medida forçou um recuo.

Na época, a primeira-dama Rosângela Lula da Silva, a Janja, atuou diretamente na articulação para reverter a cobrança. Ela passou a ser invocada por usuários críticos à medida nas redes sociais para comentar o tema. Segundo aliados, Janja teve influência na decisão de Lula de reverter a cobrança.

Na leitura de pessoas envolvidas, a hesitação nos bastidores em assumir a dianteira na ideia da taxação neste momento já é um sintoma de que o avanço da medida vai depender de todos os atores embarcarem ao mesmo tempo em sua defesa.
Interlocutores do Congresso afirmam que o tema foi discutido brevemente na última reunião de lideranças do Senado com o presidente da Casa, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), na terça-feira (9), mas ainda sem proposta formal.

A Fazenda, por sua vez, tem sinalizado disposição em negociar uma solução, mas estabeleceu como limite o equilíbrio das contas –ou seja, eventual manutenção de benefícios tributários demandará compensação com novas receitas.
Líderes do Senado defendem a devolução da MP (medida provisória) editada pelo governo em dezembro, um ato que simbolizaria a rejeição sumária da proposta, antes mesmo de qualquer apreciação.

Na quarta-feira (10), o líder do governo no Senado, Jaques Wagner (PT), disse que não trabalha com a hipótese de devolução da MP por Pacheco, que também preside o Congresso. O petista sinalizou que todas as possibilidades estão na mesa, incluindo a edição de uma nova MP ou o envio de projetos de lei.
O benefício da desoneração da folha foi criado em 2011, no governo Dilma Rousseff (PT), e prorrogado sucessivas vezes. A medida permite o pagamento de alíquotas de 1% a 4,5% sobre a receita bruta, em vez de 20% sobre a folha de salários para a Previdência.

A desoneração vale para 17 setores da economia. Entre eles está o de comunicação, no qual se insere o Grupo Folha, empresa que edita a Folha de S.Paulo. Também são contemplados os segmentos de calçados, call center, confecção e vestuário, construção civil, empresas de construção e obras de infraestrutura, entre outros.

A prorrogação do benefício até o fim de 2027 foi aprovada pelo Congresso no ano passado, mas o texto havia sido integralmente vetado por Lula. Em dezembro, o Legislativo decidiu derrubar o veto presidencial, restabelecendo o benefício setorial.
Em reação, Haddad enviou uma nova MP ao Congresso, propondo a reoneração gradual da folha de pagamentos e a consequente revogação da lei promulgada após a derrubada do veto. A medida, anunciada pelo ministro em 28 de dezembro, vale a partir de 1º de abril.

A ideia do Ministério da Fazenda é levar em consideração a principal atividade que as empresas desempenham por meio da CNAE (Classificação Nacional de Atividades Econômicas). Conforme avaliação feita pela SPE (Secretaria de Política Econômica), serão dois grandes grupos.

Um grupo de 17 atividades passaria a pagar alíquota de 10% sobre a faixa de um salário mínimo dos funcionários, e 20% sobre o que exceder essa faixa. Para outras 25 atividades, a contribuição patronal seria de 15% sobre a faixa de até um salário mínimo e 20% sobre o valor de salário que exceder essa faixa. Nesse grupo de atividades inclui-se edição de jornais.
Caso o acordo com o Congresso não vingue, o governo tem na manga duas ações a serem protocoladas no STF (Supremo Tribunal Federal), uma para questionar a lei que prorroga a desoneração da folha no formato atual e outra para contestar eventual devolução da MP pelo Legislativo.

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