BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) – A defesa do ex-CEO da Americanas Miguel Gutierrez estuda pedir uma perícia do relatório produzido pela atual diretoria da companhia à CPI que apura a fraude contábil na varejista. O objetivo é saber quem foi responsável pelos documentos que embasaram o relatório e quando eles foram criados. Com isso, afirma que será possível dizer se houve ou não manipulação por parte da varejista na elaboração da peça. O material foi apresentado pelo atual CEO da Americanas, Leonardo Coelho Pereira, em sessão da CPI realizada em 13 de junho deste ano.
O relatório continha prints e extratos de conversas por WhatsApp e email entre ex-integrantes do comando da varejista e classificava claramente o ocorrido na empresa como fraude. Antes disso, o caso era tratado como inconsistência contábil.
Além disso, caso fale à CPI, a ideia do ex-executivo da Americanas é expor a governança de uma empresa do porte da varejista e como as decisões são tomadas, para tentar mostrar que ele não teria responsabilidade pela fraude.
Com isso, a responsabilidade pelo que ocorreu passaria para auditoras, bancos e acionistas da empresa, comandados pelos empresários Jorge Paulo Lemann, Marcel Telles e Carlos Alberto Sicupira.
Procurada, a Americanas disse “que o relatório apresentado na Comissão Parlamentar de Inquérito em 13/06 foi baseado em documentos entregues pelo Comitê de Investigação Independente, além de documentos complementares identificados pela administração e seus assessores jurídicos”.
“O material indica que as demonstrações financeiras da companhia vinham sendo fraudadas pela diretoria anterior da Americanas. A companhia reforça que as investigações do Comitê Independente ainda estão em curso e que as informações prévias compartilhadas são uma demonstração do que consta no material complexo e detalhado que ainda está sendo analisado”, acrescentou.
A empresa disse que seguirá contribuindo para as investigações feitas pelos órgãos competentes e que é a maior interessada no esclarecimento dos fatos.
O pedido de auditoria passa pela nova estratégia de Gutierrez para lidar com a comissão da Câmara, que é tocada pelos escritórios Vieira Rezende e pelo MJ Alves e Burle Advocacy. A vontade do ex-comandante agora é de depor para a CPI e um pedido foi feito para que a apresentação seja realizada por videoconferência o quanto antes.
Ele apresentou um atestado médico que determina que ele não pode voltar ao Brasil antes de 25 de agosto devido a um problema renal. Gutierrez está na Espanha, país do qual é cidadão e onde tem imóvel.
Ainda não há decisão dos membros da CPI sobre permitir ou não o depoimento por vídeo, mas há resistência por parte do presidente da comissão, Gustinho Ribeiro (Republicanos-SE).
O pedido da defesa de Gutierrez se baseia em um precedente da CPI da Chapecoense do Senado Federal, que ouviu por vídeo a inspetora boliviana que autorizou o plano de voo da equipe.
O depoimento à comissão indicaria como são produzidos e auditados os documentos e balanços. O objetivo é levar a uma discussão sobre a confiabilidade do modelo em funcionamento no Brasil, alegando que não consegue inibir esse tipo de prática.
Nesse caso, o precedente citado é o do caso Enron, nos Estados Unidos, que levou à bancarrota uma das maiores empresas de auditoria na época, a Arthur Anderson, e a mudanças legislativas após uma inquirição feita pelo Congresso daquele país.
O relatório produzido pela Americanas já foi criticado em duas ocasiões na CPI.
A representante da KPMG, Carla Bellangero, e o da PwC, Fabio Mendes, disseram em seus depoimentos à CPI que os documentos relativos às duas companhias citados no relatório estavam fora de contexto.
As duas companhias auditaram os balanços da Americanas e da B2W, braço de comércio eletrônico da varejista, no período em questão.
O relatório da Americanas trouxe emails dos auditores das duas companhias nas quais eram discutidas mudanças de termos. De acordo com o CEO Leonardo Coelho Pereira, os registros eram um indicativo de que elas poderiam estar ajudando a encobertar a fraude.
Já na última sessão, realizada nessa terça (8), o economista e especialista em mercado financeiro Eduardo Moreira criticou o documento por ser “mal feito” e não seguir uma ordem cronológica.
Até agora, dois ex-executivos compareceram à CPI. O ex-diretor de Lojas Físicas, Logística e Tecnologia José Timotheo de Barros e o ex-diretor da Americanas, Fabio Abrate. Ambos deixaram de responder às perguntas no Congresso amparados em habeas corpus do STF (Supremo Tribunal Federal).
“Embora tenha convicção da minha inocência, a Americanas vem me acusando expressamente de ser responsável pelos fatos investigados. Essas acusações foram feitas de forma genérica baseada em fatos fora de contexto e documentos que sequer tivemos acesso até este momento, o que me impede de saber do que estou exatamente sendo acusado e me defender de maneira adequada”, disse Abrate em sua declaração inicial.
Além deles e Gutierrez, a CPI também já convocou o ex-diretor Márcio Cruz Meirelles que não compareceu e não apresentou justificativa. Diante disso, o presidente da CPI chegou a solicitar a condução coercitiva do ex-executivo, o que não chegou a ser feito porque os parlamentares receberem comunicação do advogado de Meirelles dizendo que ele compareceria na próxima reunião.