RIBEIRÃO PRETO, SP (FOLHAPRESS) – “Até hoje sinto fraqueza pulmonar, minha respiração não é igual e picos de esquecimento e muito cansaço físico”, diz a esteticista e cosmetóloga Edilaine Lopes Lazo, 44, diagnosticada cinco vezes com o novo coronavírus entre 2021 e 2023. Paciente oncológica, ela teve as condições pós-Covid, antes chamadas de Covid longa.
De acordo com especialistas ouvidos pela Folha, esses sintomas não dependem da gravidade da infecção e têm um espectro de diagnóstico já bem conhecido. O rastreamento de pacientes, porém, é essencial para aprimorar o atendimento.
“A situação da Covid hoje é relativamente mais tranquila, mas não é totalmente controlada. Os casos continuam existindo, as vacinas controlam a gravidade da doença, mas não controlam de uma maneira completa a infecção”, afirma o neurologista Augusto Penalva, professor honorário do Instituto Emílio Ribas.
O médico afirma que os protocolos, sobretudo os de tratamento, precisam ser monitorados para acompanhar a evolução da doença e melhorar o atendimento de pacientes.
“Muito pouco foi implementado do ponto de vista diagnóstico em saúde pública. Tem algumas estratégias diagnósticas e terapêuticas, mas ainda são extremamente complexas para uma implantação em grande escala”, afirma o médico.
Penalva diz que já existem monitoramentos importantes, como o NeuroCovBr, mas a diversidade de respostas dos indivíduos ao vírus demanda a maior cobertura possível. O NeuroCovBr acompanha cem pacientes de três macrorregiões do país e conta com profissionais de oito instituições.
Alexandra Boing, epidemiologista da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) e coordenadora da Comissão de Epidemiologia da Associação Brasileira de Saúde Coletiva (Abrasco), reforça que a Covid -19 ainda é um problema de saúde no Brasil.
“Para ilustrar a gravidade da situação, em 2024, houve mais de 300 mortes por dengue, enquanto a Covid-19 foi responsável por mais de 1.500 mortes até agora, média de 200 por semana”, aponta Boing.
Para a epidemiologista, há um acúmulo de desafios antigos e novos somados à atual crise de dengue. “É crucial melhorar a vigilância em saúde, incluindo a expansão da testagem disponível ao público, vigilância genômica, vacinação e melhoria da qualidade do ar interno”, diz a especialista.
Não existem dados sobre quantos pacientes infectados podem ser afetados pelas condições pós-Covid, mas a estimativa dos estudos, segundo Boing, indica algo entre 10% e 40% dos casos. Na cidade de São Paulo, por exemplo, em 2022 houve a notificação de 557 pessoas com o quatro e, em 2023, 358.
De acordo com o Ministério da Saúde, as condições pós-Covid são uma gama de manifestações clínicas após infecção aguda que podem ser definidas como sintomas que continuam ou se desenvolvem quatro semanas ou mais após o contato inicial com Sars-CoV-2 “e não podem ser justificadas por um diagnóstico alternativo”.
“A maior parte dos pacientes com condições pós-Covid melhora progressivamente ao longo do tempo, mas alguns podem apresentar condições pós-Covid com meses ou até mesmo anos de duração”, disse a pasta. Um consenso da Organização das Nações Unidas (ONU), de acordo com o ministério, instituiu ainda que é impossível prever quanto tempo pode durar o quadro.
A Covid pode provocar de forma prolongada, por exemplo, distúrbios neurológicos (perda de olfato e paladar, de memória e concentração, dor de cabeça), cardiovasculares e respiratórios.
Edilaine Lazo conta que seus sintomas são “terríveis”, mas que, devido à condição de baixa imunidade e de alergias a medicamentos pré-existentes, o tratamento dela foi apenas muito repouso, alimentação, antibiótico e remédio para dor. Atendida em todas as fases pelo Sistema Único de Saúde (SUS), a paciente afirma que foi sempre bem amparada e não houve demora no tratamento.
O ministério diz que o governo federal tem desenvolvido e financiado pesquisas clínicas e inquéritos de base populacional em parceria com instituições e universidades “para melhor estimar a frequência dessas condições”. Um exemplo é o estudo Epicovid 2.0, feito em parceria com a Universidade Federal de Pelotas (UFPel) e cuja coleta de dados está prevista para iniciar na segunda semana de março.
Outra frente é ampliar as coberturas vacinais, que em 2024 incluiu a vacina da Covid-19 no Calendário Nacional de Vacinação para aumentar a proteção de bebês com mais de seis meses e crianças menores de cinco anos.
Para Boing, a melhor forma de evitar as condições pós-Covid ainda é prevenir a infecção por meio da vacinação e medidas não farmacológicas, como a ventilação dos ambientes e o manejo adequado de pacientes, com investimento em pesquisa para entender a patogênese da Covid.
Penalva também aposta na vacinação para assegurar quadros cada vez mais leves e com menor invasão viral. “É o grande segredo para você evitar tanto a doença aguda, quanto a doença crônica ou complicações mais tardias da infecção pelos Covid”, diz o neurologista.