Como a Globo usou ‘Terra e Paixão’ para reagir à polêmica com beijos gays

SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – O último episódio da novela “Terra e Paixão”, reprisado na noite deste sábado (20), foi marcado por um recorde de beijos gays no horário nobre da emissora, que viveu no ano passado uma crise de imagem por cortar cenas de afeto homoafetivo em novelas e no Domingão com Huck.

Ramiro e Kelvin, interpretados por Amaury Lorenzo e Diego Martins, protagonizaram um casamento com um beijaço muito mais intenso do que o selinho de Mateus Solano e Thiago Fragos, o Felix e o Carneirinho, que há dez anos encerrou a “Amor à Vida” com o primeiro beijo gay da emissora.

“Ele era um homem bruto, cheio de suas certezas, medos e preconceitos que colocaram na cabeça dele a vida toda. Mas eu sabia que no fundo tinha um coração sensível que só queria amar, ser amado e acolhido”, disse Kelvin, de véu e delineador, ao que o amado respondeu com um discurso de declarações apaixonadas. “Eu amo demais você, de um jeito que meu coração até dói”, afirmou Ramiro.

O episódio ainda teve mais beijos entre Kelvin e Ramiro, além de outro entre Mara e Menah, vividas por Renata Gaspar e Camila Damião, que terminaram a trama juntas e noivas –muito diferente do final trágico das personagens de Christiane Torloni e Sílvia Pfeifer em “Torre de Babel”, em 1999, que morreram queimadas em um incêndio em um shopping, devido à recepção negativa do casal entre o público.

Mas não é preciso voltar muito ao tempo para identificar o conflito da emissora entre exibir o afeto de casais LGBTQIA+ e evitar embates com o público conservador. No ano passado, a Globo cortou um beijo com conotação sexual entre Clara e Helena, na novela “Vai na Fé”.

À reportagem da Folha, publicada em outubro, um funcionário da emissora envolvido na produção do folhetim disse, em condição de anonimato, que o corte não teria relação com a homossexualidade, mas com a trajetória de uma das personagens, que era casada e não poderia trair o marido para não ser rejeitada pelo público.

A crise de imagem se agravou quando um beijo do ator Carmo Dalla Vecchia em outros dois homens, durante uma performance em que ele imitava os beijos de Madonna com Britney Spears e Christina Aguilera, foi cortada do Domingão do Huck. A direção fez um corte abrupto e voltou a câmera para a plateia, que irrompeu em aplausos, para evitar a transmissão do beijo.

Os críticos especularam que o corte de “Vai na Fé” pode ter sido uma aposta da Globo para se aproximar do público evangélico, que vinha sintonizando na Record para assistir a novelas bíblicas. Já o beijo do dominical teria sido cortado não pela homossexualidade, mas por seu alto teor erótico, considerado inadequado para uma tarde de domingo, disse à reportagem um diretor da emissora, também em anonimato.

“Babilônia”, trama exibida um ano após o beijo de Félix e seu Carneirinho, mostrou que o limite para mostrar afeto entre pessoas LGBTQA+ é traçado de acordo com a aceitação do público, medida por pesquisas qualitativas feitas pela emissora. Na obra, de 2015, o beijo entre Fernanda Montenegro e Nathália Timberg levou à pior audiência para uma novela exibida na faixa das nove até então.

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