SALVADOR, BA (FOLHAPRESS) – O CNJ (Conselho Nacional de Justiça) decidiu nesta terça-feira (17) afastar de suas funções o desembargador Luiz Fernando Lima, do TJ-BA (Tribunal de Justiça da Bahia).
O magistrado foi o responsável por acatar um pedido da defesa do traficante Ednaldo Freire Ferreira para converter a prisão preventiva em regime fechado em prisão domiciliar. Conhecido como Dadá, Ednaldo é suspeito de chefiar a facção BDM (Bonde do Maluco), um dos grupos criminosos mais violentos da Bahia.
O TJ-BA foi procurado, mas não comentou a decisão do CNJ. A reportagem ainda tenta contato com o desembargador Luiz Fernando Lima.
A prisão domiciliar foi concedida em 1º de outubro, um domingo, durante o plantão judiciário. O magistrado acatou o argumento da defesa, que alegou que Dadá possui um filho com transtorno do espectro autista e que é o responsável pela criança.
O Ministério Público da Bahia pediu reconsideração da decisão. Alegou que Ednaldo Freire Pereira é perigoso e possui “comprovada participação” em organização criminosa responsável por diversos homicídios.
O pedido foi acatado pelo TJ-BA dois dias depois, em 3 de outubro, mas Dadá havia sido liberado do presídio em Pernambuco horas antes. Desde então ele não foi mais encontrado e é considerado foragido pela Justiça.
Dadá é a acusado de crimes decorrentes da sua participação no BDM, responsável por associação com o tráfico de drogas, homicídio e tortura. Ele já havia sido condenado em outro processo a uma pena de 15 anos e 4 meses por tráfico de drogas e associação criminosa.
O corregedor nacional de Justiça, ministro Luis Felipe Salomão, destacou em seu voto que elementos encaminhados pelo TJ-BA revelam conduta “pontual e diferenciada” do desembargador em relação ao réu. Afirmou ainda que a decisão do desembargador teve o intuito de beneficiar o acusado de forma injustificada, com graves danos à segurança pública.
“A conduta do magistrado maculou de forma grave a imagem do Poder Judiciário, com evidente perda da confiança dos jurisdicionados na sua atuação”, afirmou o ministro.
O CNJ determinou a intimação do magistrado para defesa prévia e ordenou a abertura de uma reclamação disciplinar para apurar a conduta do desembargador neste caso.
O afastamento cautelar é previsto em resolução do CNJ e pode ser aplicado antes da instauração do processo administrativo disciplinar.
Ednaldo Freire Ferreira havia sido preso na madrugada de 5 setembro pela PRF (Polícia Rodoviária Federal) em Sertânia (PE), usando uma carteira de habilitação falsa. Ele era considerado foragido desde maio de 2022, quando teve mandado de prisão expedido pela Justiça.
Após a prisão pela PRF, Ednaldo foi encaminhado para um presídio de segurança máxima em Itaquitinga (PE).
A decisão de conceder a prisão domiciliar para o suspeito de chefiar a facção irritou a cúpula da segurança pública da Bahia.
O estado, comandado pelo governador Jerônimo Rodrigues (PT), enfrenta uma crise na segurança motivada pelo recrudescimento das disputas por territórios entre facções que atuam no tráfico de drogas, com avanço da letalidade policial.
Dados do Fórum Brasileiro de Segurança Pública apontam a Bahia como o estado com maior número absoluto de mortes violentas do Brasil desde 2019. Em 2022, o estado conseguiu reduzir em 5,9% o número de ocorrências, fechando o ano com 6.659 assassinatos.
Também houve críticas no âmbito do governo federal. O secretário-executivo do Ministério da Justiça e da Segurança Pública, Ricardo Cappelli, foi um dos que criticaram a decisão do magistrado.
“Líder da principal facção criminosa da Bahia foi solto no plantão judiciário por um desembargador, num domingo, às 20h42. Quando outro desembargador revogou a decisão já era tarde demais, ele havia desaparecido. É normal? É aceitável?”, escreveu Cappelli em postagem em uma rede social.